quarta-feira, 24 de outubro de 2012

FALSA CONFISSÃO

Tempo em que não se pode chorar. A garganta seca, os olhos ardem, mas lágrima alguma cai. A água que escorre é seca e feita de vento. Derrama-se dos olhos unicamente a aridez.
Tempo em que não se pode confiar. Confia-se, desconfiando. E a confiança, quando vem ou vai sincera, é apunhalada, aqui ou lá. Tempo em que fazem mal querendo fazer o bem. E o bem tornou-se uma abstração forçosa de quem teima em crer que há razão em fazer o que faz.
Tempo em que os estômagos se contraem, e o peito dispara, cavalga, explode. Mas não há emoção. É só essa secura ardorosa que oprime e impede, ao mesmo tempo, de sentir, enquanto se sente tudo o que não pode ser exprimido.
Tempo em que as palavras rasgam almas, e o silêncio também. Tempo em que essas palavras ferem até sem querer. Elas ferem e só. Tempo em que os gritos são sempre gritos, até quando sussurrados. Mas já não dizem nada. A dor não se derrama. Junto com a dor, a própria punição: Permanece aprisionada no recipiente invisível do ser, indecifrável, inviolável.
Tempo em que se tenta falar sobre algo, se tenta clamar, implorar, confessar... E as intenções todas se fazem vazias. As confissões mais tolas, as mais sinceras, as mais rudes, as mais graves e sérias... São todas invólucros vazios, que encerram somente o não ser nada, o direito a nada, nada além da própria miséria interna.
Há somente a vontade. Mas não conta. As intenções são todas mortas.


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