quinta-feira, 7 de maio de 2015

ARANHA EM MEU BANHEIRO

Vi esta pequena aranha em meu banheiro. Parede branca, a escalar. Parede molhada. Eu sob o chuveiro. Tentei matá-la, primeiro objeto que veio à não, ensaia-se a ágil pancada.
Detive-me ao contemplar o esforço dela. Já amiga de mim, sem me ver. Chegava ao meio do trajeto, desabava. Escorregava ridiculamente sobre o concreto sob as patas como fios de cabelo tesos. E caía cada vez mais distante do ponto mais alto que da última vez alcançara. E caía e caía, naquela pressa úmida de quem quer chegar em casa. E não sabe onde é casa. E o caminho é imensidão branca vazia sem nome. E tive pena da aranhinha. Com bagagem como que um imenso globo terrestre, negro, preso nas costas. Com patas tão delicadas!... Jamais chegaria. E ensaiei matá-la outra vez. Livrá-la de si. De mim? Uma vez mais, falhei. Olhei dentro do imenso globo e vi meu próprio rosto. Refletido em tons de púrpura e carvalho.
Não pude. Matá-la, não pude. Já não era só aranha. Espelho coxo. Peregrina. Chamei-a Sísifa. Chamei-a "aquela que me espera". À espera da bárbara. Qualquer barbarismo cruel saudável bastava, a salvaria. Não consegui.
Mas a ela muito pouco importava. Nem se sabia Sísifa, a incapaz, a condenada. Nem sabia banheiro, nem sabia parede, branca, água, vazia. Era só aranha. E mesmo isso não sabia.
Eu é que lhe envenenei nome. A agonia da subida era toda minha. A ela não existia nada. Não sabia que sofria, não sabia que chorava. Eram minhas então aquelas lágrimas? Forcei ao chuveiro chover-me um disfarce.
A aranha era toda em si inexistência. Em mim é que se fazia globo, pata, missão, claudicante.
Meu pecado: permitir mais uma vez que o não existente exista. Fabricação minha. Pesada ilusão que sobe. Amanhã volto ao mesmo banheiro, está lá: tísica, estúpida. Deveria tê-la matado. Impossível. Se só se mata o que existe...

terça-feira, 5 de maio de 2015

NEBLINA

Tu és a minha neblina... Como Diadorim a de Riobaldo é. Nebulosa a distância, cachalote no ar. E me pergunto... Me pergunto se existirás para sempre no meu horizonte. Essa coisa indefinida. Essa massa flutuante, densamente cinza, que não se consumou.
Tu és sombra, presença-ausência, um suspiro que paira, um cansaço molinho que não cessa, um perduramento manso. De vontade dura de ferro de não se apagar. Com pontadas certeiras de agulha, a momentos.
Serás para sempre eclipse em mim? Sombra na minha senda? Cerração, nevoeiro. Tu inteiro, em inteireza líquida, que se espalha, como um punhado de ar preso em meu peito. Suspenso. Baço, que não se dissipa, espesso em sua tecitura de água. Tu és a nuvem que não passa nunca, pétrea, fixa, flutuante, imaleável - em céus que mudam de cor a cada instante.