domingo, 22 de janeiro de 2012

VEROSSIMILHANÇAS DE GRISELDA E TEREZA CRISTINA


Texto para a coluna Antenados, do jornal Tribuna Amapaense, em 7 de janeiro de 2012.

Não existe nada de verossímil em Tereza Cristina Velmont, muito menos em Griselda Pereira. Ou seja, essas duas personagens do horário nobre são seres inventados que, por mais redundante que possa parecer, jamais ocorreriam na vida real.
A começar pelos nomes. Onde no Brasil uma pessoa de fina estirpe se chama "Tereza Cristina"? Que combinação mais esdrúxula! Bem, até há certas misturas às quais já nos adaptamos. Exemplos: Ana Paula, Ana Júlia, Paulo Vitor, Carlos Eduardo, e etc. Mas, Tereza Cristina?! Eca.
Já sobre a mocinha do enredo, nunca conheci, nem ouvi falar de alguém que conhecia alguém que conhecia alguém de nome “Griselda”. Tudo bem que a "Griseldinha" não é brasileira, é portuguesa, mas duvido que existam muitas outras na terra dos lusitanos.
De volta à nossa vilã Tereza Cristina, falemos agora de sua conduta pérfida no agir e no vestir. Pode até ser que ela traje Versace, mas será que precisa usar sempre tudo “combinandinho”?! Vestido azul, colar azul, brinco azul, lingerie azul, lente de contato azul... Ufa! A ricaça poderia aprender mais com seu pajem colorido, o Crodoaldo (este nome então não vamos nem comentar...).
E sobre o rastro de crimes e malvadezas que Tereza Cristina deixa atrás de si? Não há consequências? O mau-caratismo da mulher é outra inverossimilhança das brabas... Ela já matou na escada, matou na estrada, matou no hospital, tocou fogo na casa da portuguesa... E sempre escapa impune. Com tanto talento e criatividade, difícil é acreditar que nunca arrumou um ofício para dar sentido à sua vida.
A respeito de Griselda, acrescento: se eu ganhasse 50 milhões, será que continuaria por aqui, chorando as pitangas com minhas comadres (sem lhes dar um mísero milhão), suando litros a fim de manter uma lojinha de ferramentas, enquanto minha filha continua a vender cremes, meu filho numa pensão, e o outro desempregado? É claro que não! Eu mandaria todo mundo pra Sorbonne e ia cuidar dos trâmites pra fazer meu pé-de-meia lá na China, enquanto curtia horrores em Ibiza.
Enfim. O que quero dizer é que, apesar de ter um apelo popular incrível, devido ao exagero tragicômico de seus personagens, a novela “Fina Estampa” é uma impossibilidade por si só. Como já dito, a trama pode até fazer sucesso, porque os telespectadores gostam de ver suas mazelas e virtudes ali, maximizadas... Mas não por muito tempo. Essa fanfarronice toda enjoa. Os personagens são extremamente caricatos. Não há neles as camadas das cebolas, que só os melhores autores conseguem descascar capítulo após capítulo.
Volto a afirmar: Nenhuma daquelas pessoas existiria na vida real, simplesmente porque são boas demais, ou mesquinhas demais, ou chatas demais, ou perfeitas demais, ou malvadas demais, ou nada de mais... Ninguém é assim em nenhum dos cantos do globo. Todos nós somos dotados de imperfeições e requintes, singeleza e capricho, surtos, tiques, afetações, trombas, tapas, algodão e veludo. Coexistindo. Somos personagens esféricos, vivendo novelas reais; não quadrados e óbvios, enfadonhos, nem estupidamente maravilhosos, glamorosos, audaciosos e gostosos sempre.
Desse modo, os nossos programas, nosso entretenimento em geral, devem refletir aquilo que somos, pois esta também é uma maneira de entendermos melhor a condição humana. Quando, por exemplo, assistimos a filmes ou ouvimos músicas nos quais há uma humanidade tão visceral e, ao mesmo tempo, uma beleza tão angélica, nós começamos a nos compreender melhor.
Não pretendo aqui afirmar que, para prestar, nossas distrações precisem ser exaustivamente sérias, sisudas e espartanas. Não é isso. As próprias telenovelas também servem para escapulirmos um pouco das novelas da vida real, não?... Pois bem, que seja válvula de escape, que seja invenção, criatividade, uma dose certa de exagero. Mas até o surrealismo conserva em seu nome o radical palpável da realidade.
A saga Harry Potter, por exemplo. Apesar de um aparente besteirol mistificado, conserva algo indispensável à verossimilhança, que supera a minúcia de sua autora: todos aqueles seres bizarros que lemos ou vimos são recheados de dilemas e questões demasiado humanos.
Assim, o que proponho não chega a ser nenhuma revolução televisiva ou qualquer prepotência do gênero. Também não sugiro que se troque o controle remoto por um exemplar do Nietzsche. Quero apenas, com todo o meu charmoso pedantismo, sugerir à rede Globo que me contrate para escrever a próxima novela das nove. Serei extraordinária, sem perder o elã da realidade.

2 comentários:

  1. Barbara, vc me mata de rir! Só um pergunta: pq tanta revolta com os nomes compostos? rsrsrs. Bjs amiga.

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    1. Hahahaha :P
      Não chega a ser uma revolta, é só uma leve antipatia contra as combinações esdrúxulas!
      Beijões!

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